Capítulo 7.5 - Besouros Selvagens [Cena Deletada]
Todo livro precisa sofrer inúmeros cortes antes de ser publicado. Faz parte do processo de revisão do próprio autor rever quais capítulos são realmente importantes para o andamento da história, detalhes que só encontramos depois que o livro já foi finalizado. Com isso, o blog traz as Cenas Deletadas como um extra para os leitores mais curiosos.
Esse pequeno trecho não foi revisado e nem sofreu grandes ajustes desde sua versão inicial. A cena foi retirada do Capítulo 7, após a chegada dos protagonistas na Ilha dos Geckos, entre o roubo dos pertences de Auria e o encontro com Lesten.
No trecho, vemos apenas a presença de insetos gigantes que habitam a Ilha dos Geckos, um dos monstros mais primitivos de Sellure. Há também outras cenas que envolviam besouros no livro, provavelmente isso se deve a certo fascínio do autor por essas criaturas, mas quase todas foram retiradas.
BESOUROS SELVAGENS
As Histórias Perdidas - Cenas Deletadas
Ralph lutava para
acompanhar a desbravadora que parecia mais irritada do que de costume. Como se
não bastasse estar em território inimigo, ainda tinha de lidar com ladrões que
levaram suas armas e equipamentos tão preciosos.
— Há selva para
cada canto que olhamos, como essa espécie miserável consegue viver em um local
tão pouco industrializado? — a moça reclamava golpeando algumas árvores na
tentativa de encontrar algo para comer, mas sem sucesso.
— Bem, cada um vive com
o que precisa. Geckos preferem não interferir na natureza, ela é importante
demais para eles. Se continuarmos destruindo nosso mundo a temperatura vai
mudar, e isso vai afetar a todos. Por isso os Geckos criam trilhas e seguem
mais o olfato do que a visão, é melhor do que sair destruindo tudo — explicou o
companheiro, acompanhando sua amiga.
— Ei, está sentindo
esse cheiro? — disse Auria, franzindo o cenho. — É gostoso.
Ralph sentiu a barriga
roncar.
— Você também está com
fome? — ele sorriu para ela que concordou, começando a procurar a fruta que
exalava aquele aroma tão bom.
Auria encontrou algumas
frutinhas silvestres, de folha estranhamente arredondadas e frutos amarelados,
com um caroço duro em volta. Ela colheu alguns e cheirou-os, apaixonada pelo
aroma. Jogou uma para Ralph e abriu outra para provar. Eles comeram o que havia
dentro enquanto sentavam-se de pernas cruzadas e descansavam da longa caminhada
que já se estendia por algumas horas.
— Hm, o cheiro é melhor
do que o gosto — Auria falou de boca cheia, um pouco descontente com o fruto. —
Essa coisa é horrível.
— Talvez seja porque o
cheiro vinha de outro lugar...
Ralph parou de comer no
momento em que viu algo subindo nas costas da mulher. Ele lentamente agarrou
sua espada de madeira, o que fez Auria erguer uma das sobrancelhas.
— O que pensa que está
fazendo?
— Não se mexa. Tem um
besouro gigante nas suas costas.
Provavelmente o garoto
esperava um enorme alarde por parte da moça, mas Auria manteve-se parada. Com a
ponta da espada, Ralph pegou o bichinho para examiná-lo com certo ar de
interesse. Adorava insetos.
— Que droga é essa? É
de comer?
— Isso é um Besouro do
Cheiro, que por sinal vem dele — Ralph o identificou. — Eles atraem suas
presas com esse aroma. Nós costumávamos estudá-los nas aulas de sobrevivência
onde eu morava. Deve haver aos montes nessa ilha. Conheci um velho senhor que
os cultivava como produtos comestíveis.
— Hm. — Auria murmurou
entediada, apoiando seu cotovelo sobre o joelho enquanto encarava o pobre
inseto mais de perto. — E é bom?
— Eu nunca
experimentei. Você quer? — Ralph o esticou para a mulher que fez uma careta e
afastou o bichinho. — O cheiro é gostoso, né? Não é a toa que ele atrai um
montão de presas diferentes.
Logo, Auria teve uma
ideia.
— Me ajude a encontrar
mais alguns desses. Vamos montar uma armadilha!
— Não vai funcionar —
disse Ralph, meio pensativo.
Auria desconfiou.
— Como pode dizer isso
sem que eu nem tenha comentado minha ideia?
— O capitão contou que
deveríamos evitar essa parte da floresta, esqueceu? Não estamos lidando com
nenhum bicho, quem roubou a gente deve ter passado por aqui o mais depressa que
pôde, veja como os rastros são manchados... Alguém estava bem apressado.
— Ou fugindo de alguma
coisa — Auria concluiu.
Ralph colocou o besouro
no chão e examinou-o atentamente.
— Há besouros que
possuem chifres e os que possuem mandíbulas para cortar e dilacerar suas
presas. Já ouvi boatos até mesmo de besouros que carregavam uma lança no lugar
do chifre, de tão grandes que eram! Imagina como seria ver um desses gigantes?
Seria o monstro mais surpreendente de todos.
Auria percebeu que
havia todo o tipo de insetos diferentes ali, e alguns deles pareciam realmente
ameaçadores com suas presas. No Reino de Sellure, insetos enquadravam-se na
raça dos monstros, porque alguns eram tão grandes que poderiam destruir cidades
inteiras. Suas carapaças eram blindada e alguns suportavam até oitenta vezes o
seu peso. Se o ambiente permitisse, seu exoesqueleto continuaria a crescer até
que ultrapassassem qualquer barreira de tamanho comensurável.
Ralph parou de falar
quando notou que agora eram eles que estavam sendo observados.
— Ei, Auria. Está
ouvindo isso?
— Algum sinal do
ladrão? — indagou a garota.
— Não, não. Bem
maior.
— Então do dia para a
noite você decidiu virar um especialista em vida selvagem?
— Eu gosto de insetos, acho que aprendi a entendê-los muito bem. E sei muito bem quando estamos em
desvantagem, abaixe-se!
Auria parou, voltando a
olhar para seu companheiro com as sobrancelhas franzidas. Os dois esconderam-se
atrás de algumas pedras quando um enorme besouro apareceu, carregando nas
costas um casco tão duro e resistente que musgo e plantas pareciam nascer ali.
Faltava uma de suas patas e sua carapaça era como uma armadura marcada por
cicatrizes. Os pequenos besouros do cheiro que ali habitavam ajudaram a
confundir a criatura que logo deu meia volta e voltou a seguir floresta à
dentro.
— Você viu aquilo?! Eu
quero um desses de estimação! — Ralph falou, extremamente empolgado.
— Isso explica porque
essa região da ilha era tão pouco movimentada — sussurrou Auria, apreensiva.
Os viajantes notaram
como seria assustador enfrentar uma criatura daquelas, caso o inimigo decidisse
por usar insetos ao seu favor. Os dois imediatamente começaram a correr para
bem longe dali, apertando o passo e perdendo a trilha somente para dar o fora
da floresta.
— Qual o problema das
pessoas que tentam comer besouros? — gritou Auria de forma eufórica. — E se
eles se revoltam e decidem se vingar? Nem em mil anos eu conseguiria enfrentar
um monstro desses!
— Dizem que eles têm
gosto de banana, né? — Ralph riu, ainda correndo até que suas pernas não
aguentassem. — Isso porque você ainda não viu um Besouro Gigas, e também o
Besouro Bomba! Isso sim é de colocar qualquer exército para fugir! Será que são
comestíveis também?
Os dois correram pela
floresta na medida que a selva desaparecia e o barulho ensurdecedor da relva
ficava mais baixo. O cheiro já não era tão forte, e Ralph e Auria perceberam
que estavam por fim deixando o território daquelas monstruosidades que tentavam
devorá-los para o almoço. Por sorte eles percorreram uma grande rota, e agora
estavam no extremo leste da ilha.
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